Ah! O passado que nos espera…

Ah! O passado que nos espera… O ano de 2022 ficará na história marcado pelo retorno de coisas que a gente julgava que não veria mais. Umas, um saudosista até desejava reencontrar, mas outras, nem tanto.

A inflação, por exemplo. Quem não lembra daqueles tempos em que uma ida ao supermercado era uma aventura cheia de surpresas, porque nunca se sabia quanto levar de dinheiro para o rancho. Isso, para quem ainda contava com algum dinheiro, é claro. Todos os dias a maquininha de remarcar preço estava lá carimbando as embalagens.

Lembro bem da comoção que se espalhava entre os colegas de trabalho pela simples aproximação da data de receber o contracheque. Como o salário era corrigido mensalmente, ninguém sabia quanto ia ganhar naquele mês, e a abertura do tão desejado envelope era um momento de grande euforia. Que durava pouco, claro, no máximo até chegar ao supermercado.

Depois o Brasil viveu uma fase de tédio. O custo do feijão, do arroz, da carne, era sempre o mesmo durante um mês inteiro, não havia emoção nenhuma em fazer compras. A mesma coisa quando o salário entrava na conta, uma mesmice insuportável.

Mas agora, não. Ela voltou, nossa querida inflação de dois dígitos, que faz nossas economias escoarem pelo meio dos dedos e nos deixa em permanente estado de alerta, aquela dúvida constante: teremos como pagar o aluguel no fim do mês? E comida para a próxima semana? A vida voltou a ser cheia de imprevistos.

Ah! O passado que nos espera… Outro grande amigo do passado que está prometendo voltar é o Orkut. Lembranças muito queridas me transportam lá para o começo do nosso milênio, quando entrei pela primeira vez numa rede social. Era uma novidade atrás da outra. Vivemos a primeira experiência de ser odiado, xingado e cancelado por pessoas que nunca tínhamos visto antes e que não veríamos depois. Agora estamos na iminência de ter tudo aquilo de volta. Só não sei se a rede terá o mesmo sucesso, porque o Facebook e o Twitter já canalizaram e administram muito bem todos os nossos ódios, rancores e ressentimentos. De qualquer maneira, devemos dar boas revindas ao Orkut.

Ah! O passado que nos espera… Outra que estará de volta em breve é a Mesbla. Não posso deixar de mencionar isso porque essa loja faz parte da minha vida. Mais precisamente, essa casa comercial me lembra o dia em que cheguei em Porto Alegre, vindo do interior, sem dinheiro no banco e sem parentes importantes. Pois era justamente um parente que trabalhava na Mesbla o meu primeiro contato na cidade grande. Hoje dá vontade de rir – às vezes de chorar -, quando lembro da pureza daquele garoto que queria mudar o mundo, a cabeça cheia de fantasias livrescas, sentado num banco na calçada, na frente da loja, à espera da pessoa que iria conduzi-lo pelas ruelas de um novo mundo. Eu olhava para aqueles edifícios enormes, aquela multidão se aglomerando nos espaços que sobravam da invasão dos veículos e pensava: “um dia serei importante, e bem conhecido desse povo todo, um vencedor”.

Mas, voltando aos que querem voltar. Entre esses retornos do passado eu não poderia deixar de mencionar a novela Pantanal. Não sei se vale a pena ver de novo, mas ela está aí para quem quiser assistir. Quando passou a primeira versão eu já não assistia mais novelas, e hoje, meu desinteresse por esse tipo de entretenimento é quase uma declarada aversão. Mas, pelo que me restou de algumas cenas da antiga Manchete, e pelo que vejo nas chamadas publicitárias do ‘rimeiqui‘ atual, os personagens são os mesmos.

O que não acredito que seja o mesmo é o próprio Pantanal, depois de tantos incêndios, desmatamento ilegal, grilagem de terra, garimpo clandestino e extinção das comunidades nativas. Tem coisa que não adianta querer trazer de volta porque não existem mais.

Ah! O passado que nos espera…

Infelizmente não é esse o caso dos generais brasileiros, esses estão bem vivos e fortes, e de tanques e artilharia prontinhos pra voltar ao poder. Quer dizer, tem uns que até já voltaram, mas não se contentam em bajular e bater continência para o ex-capitão expulso do exército por insubordinação. Eles querem mesmo é assumir o protagonismo na condução do país.

O alto comando das Forças Armadas se sente incomodado ao ver o atual presidente passando vergonha sozinho, sendo esculachado pelo mundo inteiro. É que o oficialato passou mais de vinte anos cavando a fossa em que jogou o povo brasileiro, os oficiais adquiriram muita experiência em enterro de esperanças democráticas, e agora, ao verem o amadorismo do ex-subordinado insubordinado eles não se contentam na condição de meros espectadores.

Porém, acho que isso é só desculpa esfarrapada. O que eles querem mesmo é retornar ao ano de 1964, no tempo em que o populacho não fazia tanto barulho, tantas manifestações na rua. Não se pode negar que hoje temos muita balbúrdia, trabalhador reivindicando de tudo, até emprego, e já vi até um grupo de abestados pedindo a volta da eleição indireta para presidente.

Os generais gostam muito daquele tempo porque não se via tanta amolação, e não necessitavam aturar o principal bagunceiro que hoje atiça o povo a sair para rua reclamar do governo. Estou falando do PT, é claro.

Ah, e por falar em PT… advinha quem é que vai voltar em outubro?

Photo by Laura Fuhrman on Unsplash